quinta-feira, abril 30, 2009

Imagem de Portugal

Durante o debate que se seguiu a uma palestra que proferi ontem na Cidade Universitária de Paris, e cuja tradução se pode ler aqui, uma estudante perguntava-me sobre o modo como Portugal era, nos dias de hoje, visto do exterior, passados que foram 35 anos desde o 25 de Abril.

É sempre muito complexo tentar sintetizar, em poucas e sempre subjectivas palavras, um olhar que é, por definição, plural e não unívoco. Mas é meu entendimento que a imagem internacional de Portugal sofreu bastante durante o período do Estado Novo, em especial quando se opôs ao movimento descolonizador, ao mesmo tempo que teimava na manutenção de um regime cerceador das liberdades. Além disso, um país que obriga à emigração dos seus cidadãos é um país que não se prestigia: por regra, cada um deve poder encontrar, na terra que o viu nascer, a forma de sustentação e de desenvolvimento da sua vida. A emigração pode ser uma opção, não deve ser nunca um destino. E, em Portugal, foi-o por quase dos séculos. E a nossa imagem colectiva não deixou de sofrer com isso.

Com a recuperação da democracia, em 1974, uma onda de boa-vontade espalhou-se sobre Portugal, recebido de braços abertos pela comunidade internacional, em especial nos organismos multilaterais, com os quais o novo regime procurou, desde o primeiro momento, trabalhar de forma altamente colaborante. Portugal conseguiu então captar a simpatia de muitos países e sectores de que estivera alheado. E, sem dúvida, a imagem internacional do país reforçou-se muito com a institucionalização democrática, com a integração europeia, com a adesão a objectivos respeitáveis na ordem externa - de que o caso da autodeterminação timorense é talvez o melhor exemplo.

Ao longo dos últimos 35 anos, a diplomacia portuguesa soube projectar a imagem de um país com uma grande capacidade de diálogo, empenhado nas grandes causas da modernidade e da ética internacionais, com posições quase sempre de grande equilíbrio e sentido de compromisso, com uma leitura serena das grandes questões mundiais - enfim, uma "diplomacia previsível", que creio ser uma das grandes armas para afirmar a credibilidade de qualquer Estado moderno. A política externa do Portugal democrático - independentemente dos governos, apenas com pontuais rupturas do consenso - constitui hoje um dos pilares mais sólidos da imagem do país, para a qual também contribui, no mesmo âmbito, o empenhamento das nossas Forças Armadas em importantes cenários de preservação da paz.

Porém, na minha resposta à estudante não disse algo que acho importante referir. Falta ainda a Portugal atingir um patamar que é condição essencial para uma imagem internacional completamente sólida: um amplo bem-estar colectivo. Lá chegaremos um dia!

8 comentários:

Anónimo disse...

Gostaria de subscrever, inteiramente, o que aqui é dito neste Post de FSC. Quem teve oportunidade de viajar antes do 25 de Abril, por essa Europa fora (e outros países democráticos avançados), recordar-se-á bem, que imagem, nessa altura, Portugal tinha.
Quanto à Política Externa, pena que muita gente neste país desconheça esse empenho que o Embaixador aqui refere.
Uma nota final para o último parágrafo: que esse objectivo, o tal amplo bem-estar social, chegue um dia - a todos - sem o qual, algumas das promessas de Abril continuarão adiadas.
P.Rufino

Sara Fidiró disse...

Perdoe-me a ousadia, mas tem um blogue muito interessante.

Gostei muito desta mensagem.

Beijinho

margarida disse...

'Puzzling'...; tantos países tiveram a partida como cerne galvanizador...
Outras nações se formaram e desenvolveram sobre essas rotas de gentes com desilusões e sonhos amalgamados.
Hoje ainda digo - partir - como se isso fosse um desígnio.
Talvez que a vontade de descobrir outros mundos nos tenha ficado no sangue.
E nos descubramos "mais" portugueses sob outros céus.
Será esse o ideal humano?
Sempre adiante.
Seja por qual for a razão.

Helena Sacadura Cabral disse...

A vantagem das pessoas inteligentes e cultas é, justamente, saberem reconhecer o bom e o mau, independentemente das ideologias.
É essa aragem que me leva a vir aqui todos os dias. Com muito prazer e aprendendo sempre alguma coisa. Mesmo quando, raramente, não concordo.
Viagei muito em trabalho. Pelo mundo inteiro. Recordo bem como eramos vistos nessa altura. E como era dura a luta para nos verem de outro modo.
Percorremos, de facto, um longo caminho!

Ana Catarina disse...

Acho que é de facto verdade que, como diz a Margarida Pereira no seu comentário,"nos descubramos "mais" portugueses sob outros céus."
Resolvi sair de Portugal porque não me identificava com o país, com a forma de pensar, de ser....enfim...precisava sair e escolhi o Brasil onde construi um pequeno hotel a 4 km do lugar onde os Portugueses pisaram em terras de Vera Cruz pela primeira vez (Barra do Cahy - Corumbau) e ao fim de 5 anos a morar neste paraíso começo a ter saudades de Portugal....a ter vontade de voltar, a dar valor ao que não dava antes....
É muito estranho.....
porque foi preciso sair de Portugal para me descubrir mais portuguesa no Brasil??? não sei responder....

Ana Catarina disse...

Acho que é de facto verdade que, como diz a Margarida Pereira no seu comentário,"nos descubramos "mais" portugueses sob outros céus."
Resolvi sair de Portugal porque não me identificava com o país, com a forma de pensar, de ser....enfim...precisava sair e escolhi o Brasil onde construi um pequeno hotel a 4 km do lugar onde os Portugueses pisaram em terras de Vera Cruz pela primeira vez (Barra do Cahy - Corumbau) e ao fim de 5 anos a morar neste paraíso começo a ter saudades de Portugal....a ter vontade de voltar, a dar valor ao que não dava antes....
É muito estranho.....
porque foi preciso sair de Portugal para me descubrir mais portuguesa no Brasil??? não sei responder....

Guiomar de Grammont disse...

Sou brasileira, mas possuo uma relação visceral com Portugal e considero muito importantes, para toda a comunidade lusófona, a imagem que Portugal vem construindo no exterior. Muito interessante esse texto.

Paulo M. A. Martins disse...

Como refere, muito bem, o Senhor Embaixador:

"Falta ainda a Portugal atingir um patamar que é condição essencial para uma imagem internacional completamente sólida: um amplo bem-estar colectivo. Lá chegaremos um dia!".

E, neste preciso momento, parece-me ainda 'valer a pena, se a alma não é pequena', rever o poema de Fernando Pessoa nos transmite em "A Mensagem":

"Quem te sagrou criou-te português.
Do mar e nós em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!"

E, como corolário, o Poeta Fernando Pessoa sempre tem razão quando sublinha que "Navegar é preciso!" E, nós Portugueses, ainda temos pela frente muito para NAVEGAR!

E, Caríssimo Embaixador Seixas da Costa, "independentemente das ideologias", como refere, muito bem, a Dra. Helena Sacadura Cabral, convenhamos que, a final, ainda "Navegar é preciso" e muito! para que se alcance o que de mais importante continua em aberto: "cumprir-se Portugal!"

Em boa verdade, já demos passos significativos, mas, convenhamos, ainda faltam muitos mais: definitivos e consolidados. Ou seja, quer queiramos quer não: "CUMPRIR-SE PORTUGAL!"

É MISSÃO!

Fraterno abraço.

Paulo M. A. Martins
Fortaleza (CE) - Brasil

Maduro e a democracia

Ver aqui .